O tarifaço anunciado por Donald Trump contra o Brasil não tem Jair Bolsonaro como verdadeiro motivo. Essa justificativa, vendida à sua base eleitoral com ares de heroísmo ideológico, é apenas um pretexto. O verdadeiro inimigo, para Trump, é o novo mundo multipolar que se forma à margem da hegemonia americana e o Brasil, como protagonista do BRICS, tornou-se peça-chave dessa transformação.
A imposição de tarifas de 50% sobre produtos estratégicos brasileiros como alumínio, aço, carne, café e suco de laranja, entre outros, não é uma reação comercial legítima, nem tampouco uma ação solidária a um aliado político, ao contrário, é uma manobra de guerra geoeconômica. O que Trump está tentando fazer é conter o avanço de um novo sistema internacional que desafia a centralidade dos Estados Unidos. Nesse sistema, o Brasil deixou de ser um figurante para se tornar um ator global relevante.
O ataque, portanto, não é jurídico, é geopolítico e o pano de fundo é claro, o BRICS representa o maior desafio estrutural à ordem unipolar norte-americana desde o fim da Guerra Fria, como apontou recentemente a revista Foreign Policy.
Trump sabe disso, ele sabe que o Brasil tem papel central na construção de rotas comerciais alternativas, como a ferrovia bioceânica, que ligará o Pacífico ao Atlântico cortando a América do Sul, com apoio chinês e participação direta do Brasil. Esse projeto, associado à Nova Rota da Seda, cria corredores de exportação fora do controle logístico dos Estados Unidos e isso fere o coração da estratégia de dominação econômica que sustentou a supremacia americana nas últimas décadas.
Atacar o Brasil é, portanto, uma forma de atingir a China e os demais parceiros do BRICS sem declarar guerra diretamente. Como aponta o Asia Times, Washington enxerga na aliança Brasil-China uma ameaça crescente ao poder financeiro americano, especialmente diante dos acordos bilaterais em moedas locais e do fortalecimento da proposta de uma moeda digital comum entre os membros do BRICS.
A retórica de Trump tenta encobrir esse cenário com o discurso de que o Brasil representa uma ameaça à segurança nacional americana e que há uma “relação comercial desleal”, contudo, isso não resiste à menor análise técnica.
O International Emergency Economic Powers Act (IEEPA), invocado por Trump para justificar a medida, foi criado para enfrentar ameaças reais como terrorismo, pandemias e conflitos militares. Usá-lo para interferir na soberania jurídica de um país democrático, apenas porque um ex-presidente responde por crimes comuns é abuso de poder e manipulação grosseira da lei.
Além disso, a balança comercial entre Brasil e Estados Unidos é amplamente favorável aos americanos em setores de alto valor agregado, como tecnologia, maquinário industrial e serviços. Não há relação desleal, nem risco à segurança. O que existe é a tentativa de punir um país por exercer sua soberania diplomática, jurídica e econômica.
Essa medida, aliás, também fere frontalmente os princípios da Organização Mundial do Comércio (OMC) e do Acordo Geral de Tarifas e Comércio (GATT). O princípio da “nação mais favorecida” veda tratamento discriminatório entre países, e as exceções por segurança nacional, usadas como escudo por Trump, estão sujeitas a controle de legalidade, como apontam especialistas da Brookings Institution.
Não à toa, a Câmara de Comércio dos EUA e a AmCham Brasil emitiram nota pedindo negociações imediatas para reverter a medida. Elas alertam que mais de 6.000 empresas americanas que dependem da importação de insumos brasileiros serão afetadas, ou seja, o tarifaço é autossabotagem, um gesto político para agradar a base trumpista, mas sem sustentação técnica ou benefício econômico real.
O que está em jogo aqui é o futuro da ordem global e o Brasil não pode recuar. Temos instrumentos legais e diplomáticos para reagir. A Lei de Reciprocidade Econômica, autoriza respostas simétricas e o próprio sistema judiciário americano pode ser mobilizado pelas empresas prejudicadas. Há, inclusive, precedentes de reversão de tarifas abusivas impostas por Trump no passado.
Mais do que isso, o Brasil tem legitimidade,somos uma democracia, nossas instituições funcionam, nosso Judiciário é soberano, nossa política externa é orientada por princípios constitucionais de autodeterminação, não por chantagens tarifárias. Como membro ativo do BRICS, temos responsabilidades globais, inclusive na defesa de uma ordem internacional mais justa, multipolar e cooperativa. Não somos inimigos dos EUA e temos total interesse em manter e melhorar sempre nossas relações, sejam políticas ou comerciais, contudo, temos que ser vistos e tratados de acordo com nosso tamanho e importância.
Trump tenta nos impor medo, mas de fato o que ele demonstra é medo. Medo de um Brasil que se afirma como potência soberana, medo de um BRICS que desafia o monopólio do dólar, medo de um mundo onde os Estados Unidos não ditam mais o destino de todos os povos.
O Brasil não é quintal, não é colônia e não será vassalo; o Brasil é um país soberano.
Bernardo Ariston é graduado em Direito, Jornalista e Radialista. Comentarista Político da Rádio Litoral Fm, colunista no Jornal de Sábado e no Cidade de Niterói. Político brasileiro. Em 2002 foi eleito deputado federal pelo estado do Rio e reeleito em 2006.
Bernardo Ariston é graduado em Direito, Jornalista e Radialista. Comentarista Político da Rádio Litoral Fm, colunista no Jornal de Sábado e no Cidade de Niterói. Político brasileiro. Em 2002 foi eleito deputado federal pelo estado do Rio e reeleito em 2006.