O ex-secretário de Saúde do Rio de Janeiro e réu na Lava Jato Sérgio Côrtes disse que transferiu US$ 1,5 milhão de uma conta que possuía na Suíça, fruto de propinas, para o grupo Odebrecht. Relatou que esse dinheiro seria internalizado posteriormente no Brasil pela empreiteira e devolvido a ele, mas que isso nunca ocorreu. Também disse que transferiu US$ 200 mil ao ex-executivo da empresa Benedicto Júnior, classificado como um amigo a quem devia favores.
Côrtes foi interrogado novamente pelo juiz Marcelo Brettas, da 7ª Vara Federal Criminal, nesta sexta-feira (2), a pedido de sua própria defesa. O objetivo era trazer fatos novos ao processo aberto a partir da Operação Fatura Exposta, que investiga o pagamento de propinas milionárias por empresas do setor de saúde ao próprio Côrtes e a outros integrantes do governo do ex-governador Sérgio Cabral.
O ex-secretário citou inclusive nomes de outros empresários que participariam dos esquemas, que envolviam direcionamento de licitações para determinados grupos de venda de materiais hospitalares e de prestação de serviços médicos. Contudo, Côrtes negou que os processos fossem superfaturados.
Perguntado sobre a conta que manteve na Suíça, Côrtes admitiu que houve transferências para a Odebrecht. “Tem uma saída indo para a conta da Odebrecht. Eu pensava em sair candidato e perguntei ao Benedicto Júnior se tinha uma maneira. Ele disse para passar para uma conta da Odebrecht, que quando eu viesse candidato nós conseguiríamos colocar aqui. Foi US$ 1,5 milhão. Ele não me deu [de volta] esse valor. Está em uma conta da Odebrecht”, sustentou Côrtes.
Segundo ele, também houve uma movimentação para Benedicto Júnior. “Foram US$ 200 mil, que era um acerto de contas com ele. Nós viajávamos muito juntos. Nossas famílias viajavam juntas. Ele pagava contas para mim. Teve aquisição de pacotes da Copa do Mundo. Eu depositei na conta da pessoa física dele”, admitiu Côrtes.
Procurada, a Odebrecht respondeu que está colaborando com a Justiça no Brasil e nos países em que atua. Porém, não citou a questão da transferência de dinheiro referida por Côrtes. “Já reconheceu os seus erros, pediu desculpas públicas, assinou um acordo de leniência com as autoridades do Brasil, Estados Unidos, Suíça, República Dominicana, Equador, Panamá e Guatemala, e está comprometida a combater e não tolerar a corrupção em quaisquer de suas formas”, diz trecho da nota. A defesa de Benedicto Junior informou, pela assessoria da Odebrecht, que não se manifestará.
Arrependido
Ao final do depoimento, Côrtes se disse arrependido e com vergonha do próprio nome. No entanto, por orientação de seus advogados, recusou-se a responder às perguntas formuladas pelos representantes do Ministério Público Federal (MPF) na audiência, os procuradores Felipe Bogado e Marisa Ferrari.
“A postura do réu não colaborou, pois ele não respondeu. Demonstrou que não tem interesse em colaborar e isso não pode servir para atenuar a pena. A defesa dele não foi colaborativa e não quis esclarecer informações contraditórias, não apresentou nomes e valores. Não contribuiu para o avanço das investigações, não foi crível”, disse Marisa Ferrari, após a audiência.
Para a defesa de Côrtes, contudo, ele trouxe novos elementos ao processo, inclusive citando nomes de empresários que se beneficiariam com o esquema de propina montado ao longo do mandato dele como secretário de Saúde de Cabral.
“A opinião da defesa é frontalmente oposta porque, no nosso sentido, o Ministério Público fez uma opção, da versão do [ex-subsecretário de Saúde] César Romero, que é um colaborador. Se essa versão é verdadeira ou não, o processo vai dizer. O Sérgio [Côrtes] é um cooperador com o juízo. Acho que ficou muito claro que a defesa trouxe fatos novos, inclusive quando a gente tentou trazer fatos novos, o MP não queria, não sei por quê”, sustentou o advogado de Côrtes, Rafael Kullmann.
Pezão
Em outro trecho de seu depoimento, Côrtes disse que o ex-governador Cabral e o atual, Luiz Fernando Pezão, receberam contribuições do empresário Ronald Carvalho, dono de uma empresa que fabrica módulos usados nas UPAs e em clínicas da família. Segundo ele, o processo de escolha foi direcionado. Questionado por Bretas se as operações com a empresa de Carvalho resultaram em propina ou dinheiro por fora para Cabral e Pezão, que na época era vice-governador, Côrtes respondeu: “O Ronald Carvalho virou um contribuinte do governador [Cabral] e do próprio vice-governador Pezão”.
O governador Pezão respondeu à acusação por meio de nota. “Repudio veementemente essa mentira sórdida, que vem de uma pessoa que não fez parte do meu secretariado. A afirmação absurda é um ato de desespero de alguém que já admitiu ser corrupto, esteve preso, vem sendo acusado frequentemente de corrupção e não honrou a classe médica. Agora, inventa mentiras para amenizar sua pena forçando uma delação premiada, com afirmações que são falsas e mentirosas”, disse a nota.