
Niterói - Um esquema sombrio que vem sendo chamado de “Máfia dos Condomínios” foi revelado em reportagem exclusiva do Jornal O Dia e está causando grande repercussão em Niterói. A investigação mostrou como síndicos, conselheiros e até administradoras se aproveitam de imóveis endividados para enriquecer às custas de moradores, utilizando brechas e práticas abusivas.
O modelo denunciado inclui assembleias manipuladas, cobrança de honorários inflados e processos acelerados de leilão, em que imóveis são arrematados por valores muito abaixo do mercado por empresas ligadas aos próprios gestores condominiais.
Especialistas apontam que o problema não é isolado: casos semelhantes já foram registrados em outras cidades do Rio e de São Paulo, mas Niterói desponta como um dos alvos preferenciais, especialmente em bairros de médio e alto padrão.
Como funciona o esquema
Segundo a reportagem, tudo começa com a identificação de imóveis com dívidas condominiais acumuladas. Ao invés de buscar acordo amigável, síndicos e administradores inflam os valores com juros e taxas questionáveis, pressionando os proprietários.
Quando o caso chega ao leilão judicial, já existe um grupo previamente articulado para comprar os imóveis a preços baixos. Em alguns episódios, os arrematantes têm ligação direta com o síndico ou com empresas de fachada ligadas à administradora.
Casos semelhantes já resultaram em escândalos: em São Paulo, um apartamento de R$ 800 mil foi leiloado por apenas R$ 200 mil por uma empresa vinculada a um ex-síndico, devido a uma dívida de R$ 30 mil.
Abusos mais comuns em condomínios
Além do esquema revelado pelo O Dia, outros abusos praticados em Niterói e no Brasil preocupam advogados especializados em direito condominial:
- Cobrança de taxas abusivas: síndicos elevam o valor da taxa de condomínio sem justificativa real, mesmo quando o prédio oferece poucos serviços ou não realiza investimentos.
- Falta de transparência: muitos moradores não têm acesso a balancetes detalhados, contratos de prestadores ou cálculos de dívidas.
- Conluio com prestadores de serviço: síndicos e administradoras escolhem empresas amigas, superfaturando contratos de manutenção, obras e serviços de segurança.
- Manipulação de assembleias: convocação feita em cima da hora, votações com quórum mínimo ou mesmo atas redigidas de forma distorcida para legitimar decisões ilegais.
- Uso pessoal do caixa do condomínio: há registros de síndicos que utilizam recursos condominiais para despesas particulares, viagens e até reformas em suas próprias unidades.
- “Síndrome do pequeno poder”: quando síndicos agem como donos do prédio, desrespeitando moradores, ignorando o conselho e centralizando todas as decisões.
Impacto para moradores
O resultado dessa má gestão é devastador: imóveis desvalorizados, moradores endividados e conflitos internos. Uma moradora de Vital Brazil, que preferiu não se identificar, relatou:
“Moro em um edifício que não oferece nada, mas o condomínio está caríssimo. O síndico é ausente, não há subsíndico e apenas uma pessoa no conselho. Estou vendendo meu imóvel, mas o valor do condomínio espanta os compradores.”
Além da pressão financeira, a insegurança jurídica é outro problema. Moradores acabam sem saber como contestar cobranças ou acessar documentos, o que abre espaço para ainda mais abusos.
O que diz a lei e como se proteger
O Código Civil e a Lei dos Condomínios preveem que a cobrança de inadimplentes pode, em último caso, levar o imóvel a leilão. Mas especialistas ressaltam que o direito de defesa deve ser respeitado e que práticas abusivas podem ser questionadas judicialmente.
Advogados recomendam que moradores:
- Participem das assembleias e exijam atas claras e detalhadas.
- Solicitem extratos bancários e balancetes sempre que houver dúvidas.
- Desconfiem de cobranças exageradas e peçam planilhas detalhadas.
- Denunciem ao Ministério Público, Defensoria ou polícia sempre que identificarem indícios de fraude ou desvio.
Necessidade de fiscalização
Para a jurista Mariana Lopes, especialista em direito condominial, é urgente que síndicos profissionais e administradoras sejam mais fiscalizados.
“O condomínio não pode se transformar em instrumento de expropriação. A governança condominial precisa ser fortalecida para garantir negociações justas e preservar o direito à moradia”, afirma.
Enquanto isso, em Niterói, moradores organizam grupos em redes sociais e buscam apoio jurídico coletivo para enfrentar o que chamam de “máfia dos condomínios”.