
A cidade de Maricá entrou no centro de uma movimentação inédita no estado do Rio de Janeiro. Em um acordo anunciado nesta terça (2), o município decidiu abrir mão de parte da arrecadação de royalties do petróleo, ao lado da capital fluminense, para beneficiar três outras cidades: São Gonçalo, Magé e Guapimirim.
O entendimento será enviado ao Supremo Tribunal Federal (STF), que poderá homologar a mudança nos repasses.
O gesto político ocorre enquanto as cidades beneficiadas travam uma disputa judicial no STF para revisar os critérios atuais de distribuição. Os valores exatos que Maricá e o Rio vão deixar de arrecadar ainda não foram definidos.
Liderado por Eduardo Paes (PSD), prefeito do Rio e defensor da redistribuição, o acordo também conta com Washington Quaquá (PT), prefeito de Maricá. Caso a proposta avance, São Gonçalo, Magé e Guapimirim passarão a receber parte da verba — juntas, essas três cidades somam 890 mil eleitores, cerca de 7% do eleitorado do estado.
Interessa lembrar que São Gonçalo possui o terceiro maior colégio eleitoral do Rio de Janeiro, atrás apenas da capital e de Caxias. Procurada, a prefeitura do Rio explicou que, com aval do STF, caberá à Agência Nacional do Petróleo (ANP) calcular os repasses conforme as novas regras, o que ainda impede qualquer previsão precisa de perdas para Rio e Maricá.
Aumento progressivo e impacto no orçamento
Mesmo sem números oficiais, São Gonçalo já estima receber R$ 386 milhões extras em 2026, valor correspondente a 50% do que a cidade diz ter direito. Entre 2027 e 2030, os aportes cresceriam 12,5% ao ano, chegando a 100%.
Para comparar: em 2024, o Rio recebeu R$ 314,4 milhões em royalties; Maricá, R$ 2,6 bilhões; São Gonçalo, R$ 45 milhões; Magé, R$ 197,5 milhões; e Guapimirim, R$ 179,3 milhões.
Um dos pontos do acordo estabelece que as cidades também desistirão de cobranças retroativas. Paes justificou a medida afirmando que a lógica deve ser metropolitana e não apenas focada na capital:
“Se essas cidades não vão bem, toda a Região Metropolitana é prejudicada. Solidariedade e empatia são fundamentais para continuarmos melhorando a vida do povo do Rio”.
Clima eleitoral e reação da oposição
A assinatura do acordo ocorreu no gabinete do prefeito de São Gonçalo, Capitão Nelson (PL). O local foi interpretado como um gesto estratégico voltado às eleições de 2026, ano em que Paes é pré-candidato ao governo e tenta atrair o partido de Capitão Nelson e o do governador Cláudio Castro.
Na Câmara do Rio, a oposição reagiu imediatamente:
“Essa iniciativa é eleitoreira. Seja qual for o valor, são recursos que farão falta à capital. O Rio precisa de mais investimentos em mobilidade e habitação popular. Não sabemos nem como as prefeituras gastarão o dinheiro”, criticou o vereador William Siri (PSOL).
Niterói fica de fora e contesta: “Perdas de R$ 1 bilhão”
A disputa criou novo atrito com Niterói, excluída do acordo. O prefeito Rodrigo Neves (PDT) recorreu à Justiça alegando que a cidade seria a mais prejudicada em uma redistribuição, podendo perder cerca de R$ 1 bilhão por ano, o equivalente a 15% do orçamento municipal.
A briga pelos royalties não é recente: começou em 2022, liderada por São Gonçalo. Com mapas elaborados por consultores que contrariavam as demarcações oficiais do IBGE, as cidades chegaram a vencer em primeira instância.
Rio, Niterói e Maricá recorreram, e o caso foi derrubado no Superior Tribunal de Justiça (STJ). Ao ser acionado, o STF passou a concordar com o STJ.