
Enquanto Belém, no Pará, recebe a COP30, encontro global que discute a redução do uso de combustíveis fósseis, a Petrobras anuncia a descoberta de um novo campo de petróleo na Bacia de Campos, no litoral do Rio de Janeiro. A novidade aprofunda o paradoxo brasileiro: o país busca liderar a transição energética, mas segue expandindo a exploração offshore em áreas sensíveis do oceano.
Descoberta em plena COP30 expõe contradições do Brasil
A COP30 acontece em Belém (PA) entre 10 e 21 de novembro de 2025, reunindo países para negociar metas climáticas mais ambiciosas e acelerar a transição energética, com foco em reduzir a dependência de combustíveis fósseis e ampliar fontes renováveis.
No mesmo período, a Petrobras anunciou nesta segunda-feira (17) a descoberta de um novo campo para exploração de petróleo na Bacia de Campos, no litoral do estado do Rio de Janeiro. O poço do bloco Sudoeste de Tartaruga Verde está localizado a 108 quilômetros da costa de Campos dos Goytacazes, em lâmina d’água de 734 metros, na faixa de pós-sal. Esses dados reforçam o protagonismo da região na produção de óleo, mas também ampliam a pressão sobre ecossistemas marinhos já vulneráveis.
Ao mesmo tempo em que defende metas mais ousadas para limitar o aquecimento global, o Brasil segue em alta na produção de petróleo, impulsionada principalmente pela Petrobras, o que tem levado especialistas a falar em uma “transição fóssil”, em que a expansão de campos offshore convive com o discurso de descarbonização.
Novo campo na Bacia de Campos: ganhos econômicos x riscos ambientais
Detalhes da descoberta no pós-sal
O bloco Sudoeste de Tartaruga Verde integra uma área já conhecida pela produção de petróleo de boa qualidade na Bacia de Campos, com lâminas d’água que variam em geral entre 700 e 1.300 metros e reservatórios em profundidade elevada.
A descoberta em área de pós-sal tende a ser celebrada por municípios como Campos dos Goytacazes, que podem ver crescer a arrecadação de royalties e o movimento na cadeia de serviços de óleo e gás. Porém, cada novo poço offshore também representa mais plataformas, mais navios e mais estruturas operando em um ambiente marinho complexo e de difícil controle em caso de acidente.
Histórico de acidentes acende alerta no litoral do RJ
A Bacia de Campos já registrou episódios que ajudam a dimensionar os riscos. Em 2011, um vazamento em operação da Chevron despejou cerca de 3 mil barris de óleo no mar, formando uma mancha de aproximadamente 160 quilômetros e causando mortes de animais marinhos, segundo estudos sobre o desastre.
Pesquisas apontam que a exploração de petróleo offshore pode gerar:
- Mortandade de fauna marinha (peixes, tartarugas, aves) em caso de derramamentos;
- Contaminação de praias, manguezais e sedimentos, com efeitos de longo prazo;
- Prejuízos à pesca artesanal e industrial, afetando diretamente a renda de comunidades costeiras;
- Impacto no turismo em cidades litorâneas, com queda de visitantes diante de manchas de óleo e poluição;
- Dificuldade técnica e alto custo para contenção e limpeza de vazamentos em águas profundas.
Ao autorizar ou expandir empreendimentos como o de Tartaruga Verde Sudoeste, o Brasil assume o desafio de evitar que novos acidentes repitam o histórico de desastres que marcaram o litoral brasileiro na última década.
COP30, transição energética e o dilema do petróleo brasileiro
A COP30 tem como um dos eixos centrais a necessidade de triplicar a capacidade de energias renováveis, melhorar a eficiência energética e reduzir rapidamente as emissões associadas ao uso de combustíveis fósseis.
Ao mesmo tempo, análises de organizações climáticas apontam que os planos de expansão da Petrobras e de outras empresas de óleo e gás podem comprometer a capacidade do país de cumprir suas Contribuições Nacionalmente Determinadas (NDCs), ampliando a produção de petróleo em um momento em que o mundo discute justamente o seu declínio.
O anúncio de um novo campo na Bacia de Campos durante a COP30 funciona como símbolo desse dilema: usar a renda do petróleo para financiar a transição ou manter, por mais tempo, um modelo baseado em combustíveis fósseis, com alto potencial de impactos ambientais e climáticos.
O que está em jogo para o Norte Fluminense
Para o Norte Fluminense, o novo campo pode significar:
- Aumento de receitas com royalties e participações especiais;
- Expansão da cadeia de serviços, logística e emprego ligados ao setor de óleo e gás;
- Maior exposição a riscos ambientais, inclusive para a pesca, o turismo e a qualidade de vida em cidades costeiras.
Por isso, especialistas defendem que qualquer nova fase de exploração venha acompanhada de:
- Licenciamento ambiental rigoroso e transparente;
- Planos de contingência para derramamentos, testados e revisados regularmente;
- Monitoramento contínuo da biodiversidade marinha;
- Participação ativa de universidades, órgãos de controle e comunidades costeiras na fiscalização.
Em plena COP30, a discussão sobre o novo campo de petróleo na Bacia de Campos não é apenas técnica ou econômica: ela revela qual caminho o Brasil pretende seguir na prática quando o assunto é clima, oceano e futuro das próximas gerações.