COLUNA LEONARDO RIVERA

As lojas de discos das últimas décadas em Niterói

Cidade de Niterói já foi um celeiro de lojas de discos e CDs nas últimas décadas. Foto: Reprodução
Cidade de Niterói já foi um celeiro de lojas de discos e CDs nas últimas décadas. Foto: Reprodução

Niterói - Assim como os cinemas de rua, Niterói já foi uma cidade repleta de lojas de discos. Sim, disco. O disco, para quem não sabe, é uma bolacha feita de vinil que reúne um conjunto de fonogramas (gravações) unidos em uma sequência. Outro formato bacana era a fita K7 – que já foi muito mais prática para usar ‘on the road’. Também pode ser considerado disco o formato à laser Compact Disc. E com uma capa, contra capa, encartes, selos, informações e muitas vezes posters, postais, broches, bottons, patches e diversos outros brindes. Era de ouro analógica, de transição pro digital, um sabor de passado com gosto de pós-futuro, principalmente para quem tem menos de 30.

Foi na loja Stop, que funcionava na esquina da Praia de Icaraí, que eu dei de cara, pela primeira vez, com discos da Rita Lee & Tutti Frutti na prateleira principal. Foram dois: Fruto Proibido e Entradas & Bandeiras. Dalí para frente a Rita nunca mais saiu da minha vida. E tinha a loja Rockshop, que vendia sanduíches e sucos com nomes de artistas e bandas, além de ter camisetas e discos para vender. Virou point total.

Já na Center Sound (que depois virou EstaSom), do querido Zé, foi que eu comprei o meu primeiro disco do Kid Abelha, porque preciso confessar que quando adolescente ouvia a música ‘Lágrimas e Chuva’. Na fase da segunda loja do Zé, quando mudou de lugar ali no shopping onde funcionava o Cinema Icaraí, comprei CDs da Laurie Anderson. E na loja do Zé tinha de tudo em disco, de vários gêneros. Ele cuidava dos produtos, trocava usados com seus clientes – incluindo eu – e, se a caixa de plástico do CD estava estragada, ele trocava por uma novinha, etc. Saudade do Zé, extremamente cuidadoso com o suporte musical. E com a música em si. Apoiava shows de músicos locais, e ouvia boa música também.

Minha experiência mais doida foi aos 14 anos, na loja do Paulo Zartranza, justamente a loja Zartranza, que ficava no Center V, no segundo andar. Nesta época da loja que eu vi, pela primeira vez a querida cantora de Niterói, Luciana Lazulli. Hoje em dia não lembro como, mas como morava na Avenida Roberto Silveira e, pra chegar no shopping, era só atravessar o Campo de São Bento, então eu vivia na loja. Fui me aproximando como cliente mirim – onde faturei exemplares de discos raros do David Bowie e Suzi Quatro, mas também conheci muito rock progressivo como Emerson, Lake & Palmer e as bandas novas da época, como da banda punk paulistana Mercenárias, que lançava sua obra prima, o disco Trashland. Tempos da Fluminense FM. Um belo dia o Paulo, que me deixava ficar “estagiando” ali na loja dele e aprendendo a vender e trocar discos, ganhando um trocado – meu pai deixava também, apesar do ambiente cheio de roqueiros e cabeludos – me autorizou a trocar vinil por cerveja. Eram vinis da promoção, tipo assim, vinil de novela, que não era raro. E eles estavam sem vender e no caixa não tinha dinheiro pra cerveja do fim de tarde. Que tempos doidos! Tinha uma lanchonete na lojinha do lado. Aliás, tinha também uma livraria, onde se juntavam uns poetas para declamar poesias. Aquele segundo andar do Center V era bem animado em 1990. Então, estava eu lá, aprendendo e conhecendo tudo, ouvindo vários vinis sensacionais, enquanto eles bebiam cerveja sempre na loja. Era um point.

Depois essa loja virou a Zeit, já do Paulo, sem os sócios, com nome inspirado em um disco da banda progressiva CAN. Foi bem parecido, eu ia ajudar, as vezes meu pai ou minha mãe davam uma incerta lá na loja pra ver se não estava arrumando bagunça, mas eu só queria saber de ouvir discos, de ler fichas técnicas e socializar com os mais velhos, amantes da música. Foi a primeira vez que vi diversos ‘bootlegs’ do Led Zeppelin, gravados por fãs em shows ao redor do mundo, prensados pelos japoneses. Aí levava meses para chegar aqui no Brasil, o valor de venda para o fã era enorme. E ainda tinha o risco de chegar quebrado e o lojista perder o dinheiro investido. Tudo feito pelos Correios.

No mesmo shopping Center V, no primeiro andar, existia a loja ABN – que tinha muitos discos de sucesso na vitrine e na prateleira, era a loja pop e mais cara do bairro na época, mas às vezes tinha promoção bacana pra se catar vinis. Meus pais e minha irmã compravam muito lá, mas eu só entrava porque era uma loja de discos. Ficava no ar-condicionado e na prateleira promocional.

Sabiá era a loja de discos do Centro, na Amaral Peixoto. Normalmente eu ia quando meus pais iam ao Rio visitar parentes, então, ao passar pelo Centro, eu já queria entrar na loja de discos. Eles aproveitavam e compravam as músicas que queriam também, meu pai dava discos de Marcio Greyck e Agepê para minha mãe, às vezes ela o presenteava com Jamelão e outros artistas que ele gostava. Lá o produto que eu comprava mais era o compacto simples, um mini vinil que vinha com a música que era sucesso de rádio e TV. Lá comprei Gretchen e Os Três Patinhos.

Para finalizar essa odisseia e lembrar como essa cidade foi um playground divertido para mim, já na adolescência e início da idade adulta, o point era mesmo a Fire Rock, no shopping Cine Center, na atual Rua Paulo Gustavo. Aliás, Paulo Gustavo, bem antes de ficar famoso, ia muito lá na loja. Era um espaço frequentado pelas bandas, os descolados, fãs de Nirvana e similares, que se reuniam para beber, fumar cigarro de Bali, comprar e trocar CDs. Já era uma outra geração, de gente que ia no Convés (Gragoatá), Studio Bar (Pendotiba), Gato Preto (Itaipu) e no Bedrock (Charitas). Mas aí já é outra coluna: a que vou escrever sobre as casas de shows alternativas de Niterói.

Um beijo e um abraço, querido leitor. Dedico essa coluna ao querido amigo Marcos Hasselmann (que deu a ideia de escrever sobre as lojas de discos da cidade) e ao jornalista e radialista da Flu FM, a Maldita, Luiz Antônio Mello, que está se recuperando da saúde. Que a gente consiga sempre renascer e trazer as melhores histórias para contar. Até a próxima coluna.

Leonardo Rivera

Atuante no jornalismo fluminense desde a adolescência, Leonardo Rivera teve passagens por jornais de sua cidade, Niterói – como os saudosos LIG e Opinião, além do diário A Tribuna. Tornou-se diretor artístico da área musical no final dos anos 90, tendo trabalhado na Universal Music com grandes nomes da nossa música, e em seguida criou um selo para novos talentos. Também se tornou escritor, ao lançar a biografia sobre Seu Jorge (2015) e participar da equipe da autobiografia de Luiz Fernando Guimarães (2022). Segue dirigindo o selo musical, colaborando com biografias e veículos de comunicação.

Atuante no jornalismo fluminense desde a adolescência, Leonardo Rivera teve passagens por jornais de sua cidade, Niterói – como os saudosos LIG e Opinião, além do diário A Tribuna. Tornou-se diretor artístico da área musical no final dos anos 90, tendo trabalhado na Universal Music com grandes nomes da nossa música, e em seguida criou um selo para novos talentos. Também se tornou escritor, ao lançar a biografia sobre Seu Jorge (2015) e participar da equipe da autobiografia de Luiz Fernando Guimarães (2022). Segue dirigindo o selo musical, colaborando com biografias e veículos de comunicação.